“DEUS O RESSUSCITOU E NÓS SOMOS TESTEMUNHAS”

Celebramos o tempo da Páscoa, a maior festa da nossa fé: um tempo de alegria, de alegria espiritual, de alegria interior. Celebramos o triunfo de Cristo sobre o pecado e a morte, ao longo dos 50 dias, que vão do Domingo da Ressurreição ao Domingo de Pentecostes.

Na primeira leitura, Pedro, figura central do livro dos Atos, proclama à multidão que o Deus de Abraão, o Deus de Isaac, e o Deus de Jacó, o Deus da história, ressuscitou Jesus. Pedro tenta dialogar com os judeus do seu tempo através de três verbos: traíste, negaste, mataste… “mas Deus o ressuscitou e nós somos testemunhas”. Ele não procura acusar, mas quer que as pessoas sejam salvas, quer fazê-las acreditar que a morte não é o fim. 

É importante perceber que Jesus não ressuscita a si mesmo, pela sua ação ou pelo seu poder, mas estamos diante da ação de Deus na história. Por um lado, o autor se preocupa em marcar a presença de Jesus na comunidade cristã; e por outro, em afirmar que Jesus Cristo tem um relacionamento com o Deus de Israel. Esse Deus tem uma ação na história e continua agindo na Comunidade Cristã.

A Segunda Leitura (1Jo 2,1-5a) fala que é através de Jesus Cristo que recebemos o perdão dos pecados, Ele é nosso defensor diante do Pai. Se vivermos os mandamentos, eles nos levam a amar a Deus e aos nossos irmãos e irmãs. Assim, rompemos com o pecado e assumimos a sua vontade. Pecado é querer entender tudo a partir da nossa própria lógica. O autor nos convida a voltar a Deus, à sua palavra, e a abrir-nos aos sinais de Deus na história e a ter uma vida coerente.

No Evangelho de Lucas (Lc 24,35-48), a aparição de Jesus aos onze e aos seus companheiros é dividida em três partes logicamente coordenadas: as testemunhas, que inicialmente duvidam, são finalmente convencidas da realidade da ressurreição.

No Evangelho deste domingo lemos o texto que se segue ao relato dos discípulos de Emaús, que chegaram a Jerusalém, contaram o que lhes havia acontecido no caminho e como reconheceram Jesus quando ele partiu o pão. E segue-se uma interrupção: o próprio Jesus aparece entre eles e lhes diz: “A paz esteja convosco”. Com esta interrupção, o autor diz-nos que não podemos contar apenas com o nosso testemunho; ele deve ser interrompido pela Palavra de Deus, que começa com uma saudação de paz. Esta saudação nos textos da ressurreição é função do bem-estar, da tranquilidade e da confiança que Jesus dá aos seus discípulos.

A presença de Jesus nos transforma, como por mágica, os discípulos de início têm medo, como se estivessem vendo um fantasma. No fundo, dúvidas de todo tipo: há aqueles que não acreditam por causa da alegria; outros ficam surpresos. Foi um fato difícil para eles. 

Os textos oscilam entre o acontecimento e os tempos da comunidade de Lucas. Sempre teremos esses dois tempos, portanto, essas dúvidas, medos e confusões vão permanecer. É por isso que o testemunho é importante. Mas o testemunho não é fácil porque não há provas: eles não têm como provar que Jesus está vivo.

O que percebemos diante do medo, da hesitação dos discípulos, é que eles eram tudo menos ingênuos, ou pessoas que poderiam ser facilmente manipuladas. Vemos a resistência dos discípulos em acreditar em algo que nunca presenciaram. Eles haviam testemunhado que Jesus ressuscitou Lázaro, a filha de Jairo, o filho da viúva de Naim; ou seja, aqueles que haviam morrido voltaram à vida que tinham, provaram a morte, mas voltaram à vida. 

Mas o que eles estavam vivenciando não era o mesmo, Jesus não voltou para a vida que tinha antes. Jesus deu um passo rumo à vida eterna. Eles estão tendo a experiência de ver o corpo glorificado de Jesus. “Jesus não voltou a uma vida humana normal deste mundo, como Lázaro e os outros mortos que Jesus ressuscitou. Ele entrou em uma vida diferente e nova, na imensidão de Deus.” (Bento XVI).

O texto de Lucas é muito realista, Jesus sabe que a sua presença é um fato difícil para seus discípulos. Neste contexto de dúvidas, o autor mostra a delicadeza e a preocupação de Jesus com seus amigos. Jesus permanece com eles, mostra-lhes as mãos e os pés, sinais da sua realidade humana. Ele não pede que você olhe para o seu rosto, mas para suas feridas, para seus sinais. Ele diz: “Olhem para os meus sinais e vocês me reconhecerão, não com olhos humanos, mas com fé.”

E como as dúvidas persistiam, pediu algo para comer. Era necessário deixar claro que não se tratava de um fantasma, de uma ilusão: e que isto ajudaria os discípulos a perceber esta dimensão do visível-invisível, para não deixar dúvidas na comunidade cristã.

Que diferença faz se acreditamos ou não na ressurreição? A presença ressuscitada de Jesus diz que esta vida não termina com a morte, mas sim numa continuidade descontínua. Então, o que posso temer? 

Uma vez estabelecida a misteriosa realidade da ressurreição, Jesus se dedica a “abrir suas mentes” para que possam compreender o que aconteceu. Ele explica as escrituras judaicas em suas três partes: a Torá, os Profetas e os Salmos. Então ele lhes disse: “Está escrito que o Messias tinha que sofrer e ressuscitar dentre os mortos no terceiro dia.” É todo um passado que ganha sentido. 

Os primeiros cristãos não tinham como explicar a ressurreição, o que tinham eram os anúncios feitos nos escritos judaicos. Jesus vem para cumprir as promessas feitas a Israel. Esta releitura da história será sempre uma característica do cristianismo. 

O fruto da ressurreição é a Paz. Aqueles que acreditam na ressurreição vivem de maneira diferente daqueles que não acreditam. Ele está ciente de que somente passando pela morte poderá ser ressuscitado. Quando aprendemos a morrer para o pior de nós mesmos, para o nosso egoísmo, para o desejo de vingança, para a falta de perdão e de amor, nasce o melhor de nós; Então, experimentamos a paz, fruto da conversão, de uma vida nova e ressuscitada.

“Quem não acredita na ressurreição vive apegado, apegado às coisas deste mundo, acredita que os prazeres deste mundo preenchem suas vidas.” (Santa Maria Eugênia)


Mercedes Frogel

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