“Cada um de nós tem uma missão sobre a terra.” Esta frase de Santa Maria Eugênia me acompanha desde que entrei na Congregação e desejava ser missionária fora do Brasil. Atendendo a um apelo do Conselho Geral, me candidatei com o apoio da Província Atlântico Sul para ser enviada a Madagascar. Um país insular situado no Oceano Índico separado da costa africana pelo canal de Moçambique. A grande ilha vermelha, a quarta maior ilha do mundo, identificada desta forma por causa da cor da sua terra.
Estou em Madagascar desde novembro de 2018 quando fui enviada pela Congregação das Religiosas da Assunção, presente no país desde 2016, depois da fusão com a Congregação das Irmãs Agostinianas de Nossa Senhora de Paris. Vim para viver uma experiência de partilha do carisma e da espiritualidade das Religiosas da Assunção com as Irmãs desta província.
Inicialmente o envio foi por um ano, mas o projeto de Deus era outro e várias situações favoreceram a minha permanência por um tempo mais longo. Primeiro, o visto de longa duração levou muito tempo para ser liberado. E quando saiu me foram concedidos dois anos de permanência no país. Depois, em 2020 apareceu a pandemia do coronavírus e as fronteiras marítimas e aéreas do país foram fechadas. Por isso, tive que pedir mais um ano de permanência. E aqui estou.
Madagascar tem uma cultura extremamente rica e diversa. O país tem 23 regiões ou províncias e o povo é formado por dezoito diferentes etnias cada uma com sua cultura e costumes específicos. A língua nacional é o malgaxe e a segunda língua é o francês. Cada região/etnia tem seu dialeto.
Este é um belo país com um povo apaixonante, alegre, trabalhador, lutador e de uma resistência impressionante diante das adversidades da vida. Um povo de fé que conta com a proteção de Deus e dos seus ancestrais. E quando a gente conhece um pouco da realidade das carências e falta de estrutura como transporte, água encanada, gás para cozinhar, energia elétrica em várias partes do país, a gente passa a reconhecer os valores e a força deste povo, principalmente daquelas que moram no campo e precisam caminhar quilômetros e quilômetros para levar o que produzem até o mercado para vender. E transportam tudo na cabeça e nas costas. Mesmo as crianças são obrigadas a enfrentar os desafios e as dificuldades junto com os pais para conseguir o pão de cada dia.
A Assunção está presente há bastante tempo no país através das outras congregações da Família Assunção: os Agostinianos da Assunção, as Irmãzinhas da Assunção e as Orantes da Assunção e agora nós as Religiosas.
A província das Religiosas da Assunção tem 09 (nove) comunidades em diferentes regiões do país: uma comunidade em Antananarivo, a capital do país, cinco comunidades na região central, duas comunidades na costa oeste do oceano Índico e uma comunidade no sul. Estamos presente em cinco dioceses diferentes.
A missão da província está centrada na educação escolar, atendendo quatro escolas de algumas das dioceses onde estamos e duas escolas da congregação, alguns centros sociais que atendem jovens e adolescentes do campo (promoção feminina), com cursos de corte-costura, bordado, formação humana, catequese, projetos de geração de renda como criação de peixe, galinha, patos, coelhos, hortas etc. Normalmente se busca dar uma formação também para os pais e famílias das jovens que são atendidas nos centros sociais, o trabalho com saúde e o acompanhamento da pastoral principalmente, as comunidades e capelas no meio rural. Em todas as comunidades temos grupos de Assunção Juntos.
A minha experiência nesta missão além-fronteiras é muito rica e apaixonante. Madagascar tem uma cultura com muitas coisas parecidas com o Brasil e ao mesmo tempo, bem diferentes. Imaginem, aqui comemos arroz todos os dias três vezes ao dia. Têm feijão, mandioca, jaca, jamelão, jambo, cajá-manga e muitos outros alimentos que temos no Brasil. Quer dizer, há uma proximidade, mesmo que a maneira de preparar os alimentos seja diferente. Isto ajuda no processo de adaptação.
Eu, também me senti muito parecida com o povo malgaxe, mesmo fisicamente e com os traços do povo daqui. O que me impede de dizer que sou uma malgaxe é a língua. Mais todo mundo pensa que sou uma nativa. Isto também ajuda na aproximação.
Quando cheguei a Madagascar fui enviada a Comunidade de Manandona, na região central do país. Vivi nessa comunidade por um ano e aos poucos fui conhecendo a realidade do país e do povo de perto e me desfazendo de informações distorcidas que se encontra aos montes nos meios de comunicação e nas mídias.
No ano seguinte fui enviada para a Comunidade de Ampasemanjeva na costa oeste do país. Um vilarejo bem no interior sem energia elétrica, que quando as chuvas são muito fortes e intensas alagam a estrada de saída para a rodovia nacional deixando o povoado isolado, às vezes por vários dias. Mas o povo é muito solidário e busca os meios de vencer todos os desafios e percalços que se apresentam.
Eu vim para Madagascar pra viver com as irmãs da província e partilhar o que é a vida religiosa das Irmãs da Assunção, a espiritualidade e o carisma próprios da Congregação. Então, a minha participação é interna nas comunidades onde tive a oportunidade de viver durante este tempo aqui. No final do ano passado fui enviada para a comunidade de formação. Nós temos na mesma comunidade duas etapas de formação: o postulado e o noviciado. Este ano tem um grupo de dez noviças, quatro do segundo ano e seis no ano canônico. Temos ainda sete postulantes. Meu trabalho este ano é ajudar na formação das jovens com os aprofundamentos sobre o carisma, a espiritualidade, a vida de Maria Eugênia, a história da congregação, a liturgia e conhecimentos gerais. Com a comunidade temos aprofundamento sobre a liturgia na Assunção dentro do programa de formação permanente.
A missão me dá a oportunidade de re-apropriar do nosso carisma, da espiritualidade e de nossa missão de educação transformadora. É uma experiência extraordinária que exige abertura, flexibilidade, um olhar largo e compassivo, uma abertura de espírito e de coração. Que pede também, um grande respeito ao outro, ao diferente. Respeito à cultura e ao seu jeito de ser. Abertura para acolher e escutar. Escutar não só com os ouvidos mais com o todo o ser. Contemplar e reconhecer Deus presente numa realidade que não conheço. No meio de um povo sofrido que está ali, como sinal de sua presença. Sim, esta experiência me pede um desprendimento profundo de preconceitos e ideias pré-concebidas. Mas também me ajuda a reconhecer que nós da Assunção temos uma grande missão nesta realidade. Nosso carisma pode contribuir muito num processo de formação das pessoas e de transformação da sociedade de Madagascar, naqueles lugares onde estamos presentes.