Quem não se maravilhou ao assistir às Olimpíadas pela televisão? Desde a cerimônia de abertura dos Jogos, tão diferente pois realizada em pleno ar livre, fora dos padrões normais de um estádio esportivo, como acontecia até então nos Jogos Olímpicos anteriores, muitos de nós batemos palmas… E depois, nas diversas competições esportivas, seguíamos com atenção, torcíamos por nossos atletas, nos alegrávamos ao ver nossa bandeira no pódio…

As Olimpíadas proporcionam ao mundo um espetáculo de beleza e de fraternidade entre as nações. Se torcemos para que nosso país “faça bonito”, não estamos torcendo contra os outros, mas admiramos também as medalhas ganhas por atletas que representam outros países. Quem não viu e admirou as cenas de amizade e de respeito mútuo protagonizadas pelas duas maiores estrelas da ginástica, Simone Biles e Rebeca Andrade?
Sim, fomos testemunhas de momentos de harmonia, de superação, de beleza, de alegria. Os jornais, a televisão, traziam todos os dias notícias das competições, das medalhas ganhas, dos aplausos de quem estava lá, assistindo e se alegrando. E também admirando até onde chega a capacidade do corpo humano na sua busca pela perfeição esportiva. Mas tudo isso chegou ao fim… As delegações dos atletas voltaram a seus respectivos países, onde novos treinos e novos desafios os esperam, e também a outros que, daqui e quatro anos, participarão de uma outra Olimpíada, em outro lugar do mundo…
Mas, o que está acontecendo em Paris, pouco dias depois de ter terminado a grande festa mundial que foram as Olimpíadas? Será que estamos tão ligados nas provas e nos pódios como estávamos há poucas semanas atrás?
Sim, porque ainda há pódios em Paris… Ainda houve uma cerimônia de abertura, ainda que não em barcos no rio Sena… Ainda há competições… Ainda há lágrimas de alegria… Ainda há braços levantados em sinal de vitória…
E essas vitórias – ousaria dizer – são ainda mais significativas do que as vitórias das Olimpíadas… São as vitórias de uma imensa superação… São as vitórias de uma força de vontade capaz de ultrapassar inúmeras barreiras… São as vitórias de pessoas que, por diversas razões, poderiam ter tido suas vidas truncadas, mas que souberam lutar e vencer… São vitórias que nos emocionam a todos… São as vitórias das Paralimpíadas.
Nas Olimpíadas, nós nos admiramos com a tenacidade de alguns de nossos atletas que chegaram ao pódio e que vieram de comunidades de periferia, que treinaram em condições ruins, em pistas esburacadas, e que mostraram como a pessoa pode vencer certas limitações e chegar a desenvolver os limites de sua capacidade. Pois bem, como não nos admirarmos com nossos atletas paralímpicos, que para chegar aonde estão hoje tiveram que vencer limitações de treinamento, mas também de limitações de seu próprio corpo? Como não admirar os velocistas e os jogadores de futebol que competem e são cegos? Como não admirar um nadador que compete numa piscina e a quem faltam um ou mais membros no próprio corpo? Como não admirar um time de vôlei que compete em cadeiras de rodas porque são paraplégicos? Como não. admirar uma pessoa que compete em tiro de arco usando a boca e os pés por não ter braços?… São esses fatos que vemos nas Paralimpíadas…

O ser humano é capaz de grandes coisas… Todos nós conhecemos pessoas que foram capazes de superar situações e fatos muito difíceis em sua própria vida. E todos nós conhecemos também pessoas que se deixam abater e que praticamente “desistem” da vida por coisas pequenas. Qual a nossa própria posição diante das dificuldades ou dos momentos de crise que a vida pode nos apresentar? Sou do “time” que luta, ou faço parte do que desiste?…

No Antigo Testamento encontramos um conselho bem curto, mas que vai muito longe. É no livro do Deuteronômio. Neste texto, Moisés está falando ao povo, dizendo que ele tem diante de si dois caminhos. É preciso fazer uma escolha… E Moisés dá este conselho ao povo: “Escolhe a vida” (cf. Dt 30,19).
Mas o que é “escolher a vida”? Escolher a vida é escolher o que nos dá mais vida, é escolher o melhor para cada um de nós. É escolher o caminho que nos leva a viver em plenitude. É desenvolver as qualidades e os dons que recebemos de Deus. É lutar contra os nossos próprios defeitos a fim de nos tornarmos pessoas melhores.
Nisto, temos alguma semelhança com os atletas paralímpicos. Eles lutaram contra um problema físico que os limitava. Treinaram, suaram, sofreram, mas a força de vontade e o desejo de vencer a dificuldade os levaram a feitos que merecem medalhas. Nosso problema é outro: para vencer as barreiras que encontramos na vida, lutamos não contra uma limitação física, mas contra nossos próprios defeitos que, de uma certa maneira, nos limitam.
Sobre esta nossa luta, que é uma luta diária e que pode nos acompanhar ao longo de toda a vida, Santa Maria Eugênia dizia: “Deveríamos agora (…..) tomar a decisão enérgica de combater um de nossos defeitos. Mas qual? (…) Aquele que mais pesa no nosso próximo. Santo Inácio nos recomenda adquirir a virtude que é o contrário de nosso defeito maior. (….) Todas nós temos alguns defeitos particulares as serem combatidos; para uma, é o orgulho; para outra, a impaciência (….)” (07 e 21/01/1872).
Poderíamos nos perguntar: qual é o meu maior defeito? Qual é aquele que devo combater de modo especial, me exercitando para adquirir a virtude que é o contrário dele? É preciso que nos exercitemos diariamente nesse combate como fazem os atletas para vencer suas próprias limitações. Essa luta não se vence em poucos dias… É o trabalho, às vezes, de toda uma vida.
Mas os atletas paralímpicos nos estimulam para essa luta, que eles enfrentam no plano físico, e nós, no plano dos nossos defeitos. De fato, diz Raissa Rocha Machado, que é paraplégica e compete no lançamento de dardo: “Falo que o esporte paralímpico evolui de quatro em quatro anos, pois é nesse período que passamos na televisão e temos uma visibilidade muito boa. Não somos coitados; somos pessoas para (você) se inspirar” (em entrevista para o “Correio Braziliense”, de 1º de setembro de 2024).
Sim, eles são inspiração para nós na busca de nos tornarmos pessoas melhores. Ligando as palavras Sta. Maria Eugênia com o exemplo dos atletas, entremos nessa luta. Não haverá um pódio para nós, mas haverá uma medalha, sim! E essa medalha, quem a porá em nosso pescoço é o próprio Deus.

 
Irmã Regina Maria Cavalcanti

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