24 de novembro de 2024
Chegamos ao final do Tempo Comum. No próximo domingo daremos início a um novo ano litúrgico, com o primeiro domingo do Advento.
Neste domingo celebramos a solenidade de Cristo Rei. Após vivenciarmos a vida de Jesus, através de suas palavras e sua prática, durante o ano que termina, chegou o momento de reconhecermos e proclamarmos que ele é nosso mestre, pastor e o REI DO UNIVERSO.
Celebramos também o dia dos cristãos leigos e leigas, os seguidores e seguidoras de Jesus que buscam amar e servir como ele mesmo fez.
A primeira leitura, do livro de Daniel (Dn 7,13-14), foi escrito no período de dominação grega. Os judeus eram perseguidos por Antíoco IV Epífanes que queria impor a eles a cultura e religião grega. As formas de resistência a este domínio foram a luta armada ou através de escritos que mantinham os valores e a esperança do povo.
O livro narra a história do jovem Daniel, fiel aos costumes judaicos, que vivia exilado na Babilônia.
O texto da leitura de hoje nos apresenta um trecho do sonho de Daniel. Na primeira parte do sonho (que não está narrado aqui) ele vê quatro animais horrendos que saiam do mar. Cada uma dessas figuras representava um dos impérios que dominou Israel após 786 a.C. (Babilônico, Medo, Persa e Grego). Ele vê descendo das nuvens um “Filho de Homem”, que recebe de Deus o poder e a honra para reinar sobre todos os povos e vencer as forças opressoras. Esta visão vai alimentar a esperança do povo oprimida daquela época.
Jesus vai usar essa imagem de “Filho do Homem” para si mesmo, dizendo que ele veio trazer a libertação para os oprimidos e instaurar um reino que não é como os reinos deste mundo. Esse reino durará para sempre.
A segunda leitura é do livro do Apocalipse (Ap 1,5-8), que significa revelação de algo oculto. Foi escrito em torno do ano 95, na Ásia Menor (hoje Turquia), quando Domiciano era o imperador romano. As comunidades cristãs da Ásia Menor viviam uma forte crise, pois Domiciano perseguia cruelmente os cristãos e muitas heresias surgiram no interior das próprias comunidades. Muitos cristãos foram martirizados nessa época. Domiciano também exigia ser reconhecido como senhor e deus.
Nesse contexto o livro foi escrito para manter a esperança dos seguidores e seguidoras de Jesus.
O texto de hoje é a introdução do livro do apocalipse e nos apresenta Jesus com os títulos cristológicos das primeiras comunidades cristãs: pela sua atividade Jesus é a “Testemunha Fiel”; ele foi o primeiro a vencer a morte, pela cruz e ressurreição por isso ele é o “ Primogênito dos Mortos”; e por ter iniciado um novo reino para todos e ter sido exaltado na Ascensão ele é o “ Príncipe dos reis da Terra”. Com esses três títulos evocam-se três mistérios da vida de Jesus: Encarnação, Ressurreição e Ascenção-Exaltação.
Logo após a apresentação de Jesus, vem a glorificação, referindo-se à salvação trazida por Cristo pelo amor e pelo seu sangue e nos tornando reis e sacerdotes para Deus.
O versículo 7 nos apresenta a profecia que faz alusão ao livro de Daniel: “Ele virá nas nuvens.”
No final do texto vem a afirmação de quem é Deus: o Alfa e Ômega (a primeira e a última letra do alfabeto grego), o Princípio e o Fim de tudo e de todas as coisas. A característica final, Todo-Poderoso, é uma contestação ao culto ao imperador e desejo de controle absoluto do Império Romano.
Nossa fé não pode se acomodar diante da corrupção, da ganância, das injustiças, nem aceitar um sistema que gera miséria e opressão. Fomos constituídos sacerdotes para servirmos a Deus no mundo, no nosso cotidiano. O sacerdócio não é um cargo, mas uma função de serviço a todos, principalmente o serviço de manter a fé e a esperança em tempos difíceis.
O Evangelho (Jo18,33b-37) desta festa é do evangelista João e nos traz a cena do julgamento político de Jesus. O texto gira em torno de três palavras-ideias: rei, reino, verdade.
A cena nos mostra Jesus diante de Pilatos que o interroga. Pilatos inicia o interrogatório com uma pergunta direta: “Tu és o rei dos judeus?” Esta é a acusação que as autoridades judaicas fizeram a Jesus: a pretensão de tornar-se rei. Mas Jesus responde que é o rei esperado por Israel, mas seu reinado tem uma perspectiva diferente dos reinos deste mundo.
O reino do qual Jesus fala é um reino baseado no amor, no serviço, no compromisso, na entrega amorosa à vontade e agir de Deus.
Quando Deus formou seu povo, ele deu uma missão a esse povo: ser profeta, sacerdote e rei. Jesus, sendo o Deus encarnado, foi plenamente profeta, sacerdote e rei.
A função do rei é cuidar do povo. Jesus é rei porque é aquele que cuida de todos com carinho, principalmente dos mais vulneráveis. É um rei que está em profunda comunhão com Deus, é próximo de todos e reina através do serviço. Jesus é rei de todos os que ouvem a sua palavra e procuram vivê-la no dia a dia.
Quando Jesus se refere aos reinos deste mundo são os que tem fundamento no poder político, militar, na riqueza, no conhecimento intelectual, no prestígio. Os valores do reino de Deus não são os valores que o mundo nos apresenta. Os valores do reino de Deus são aqueles que Jesus apresentou ao povo nas bem aventuranças: humildade, mansidão, misericórdia, justiça, paz, verdade. Estes valores devem crescer dentro de nosso coração e se tornarem prática em nossa vida.
Jesus diz a Pilatos que ele veio ao mundo para dar testemunho da verdade. A palavra verdade, em grego aletéia, significa sem véus, desvelar. Jesus veio ao mundo para desvelar quem é Deus. A verdade na Bíblia é a fidelidade a Deus. Esse Deus que se encarna como ser humano, que acolhe e cuida dos injustiçados e dos que sofrem, que se faz próximo de todos. Pelo seu amor incondicional e pela sua prática Jesus é a Testemunha Fiel da Verdade.
Jesus é rei e Senhor; um rei que está a serviço de todos e principalmente dos mais vulneráveis. É um rei em que seu trono é a cruz e sua coroa é de espinhos, consequência de seu amor ao projeto de Deus e de sua opção pela verdade.
Num mundo onde nos tempos atuais o que vale é o poder, o prestígio, em que todos usam da mentira e das fake News para levar vantagem, viver na verdade é estar em profunda comunhão com Jesus, com seus ensinamentos e com sua prática.
Batizados em Cristo recebemos a missão de sermos, profetas, sacerdotes e reis. Essa é a nossa vocação-missão de cristãos: continuar estendendo o seu reino no mundo, nas pessoas e em nós mesmos.
Ir. Nádia Lúcia Souza Cotta