Amar sem medida
A liturgia de hoje é apelo à tolerância. Saber acolher e conviver com o diferente é ação que vem do Espírito Santo de Deus. Daí a necessidade de se deixar impregnar do legado que Jesus de Nazaré ensinou em sua catequese cotidiana. Compreender que somos feitos de barro é um passo para a prática do amor que torna a vida mais humana. Somos filhos e filhas do mesmo Pai. Podemos afirmar que temos a mesma consistência em se tratando da origem que nos gerou e nos deu a vida. O cuidado e a correção fraterna a partir do amor maior, é sinal da presença do Ressuscitado e da misericórdia de um Deus que se fez humano e reanima a comunidade no caminho do perdão e da caridade. Cuidar de quem por ventura cometeu algum desvio, é o ponto alto do amor sem medida.
A leitura de Ezequiel (Ez 33,7-9) delega a responsabilidade de cada um pelo seu semelhante. O profeta escolhido por Deus para exercer uma nova missão junto ao seu Povo, vai descobrindo que na raiz de toda decadência do povo de Israel está sua infidelidade a Javé, por isso ele é chamado para ser sentinela, anunciar e animar as excluídas e os excluídos para a esperança da salvação. É missão do profeta erguer quem está caído. Deus não desiste de sua fidelidade e nem da aliança que fez com o povo. Ele cuida do povo através do profeta e pede para adverti-lo em nome de Deus. O profeta não pode compactuar com o mau feito, ele precisa combater as injustiças, a exploração, o ódio e a corrupção. é função do profeta confirmar a conduta do justo e confrontar o ímpio convidando-o que se converta. O que Ezequiel coloca para nós hoje, é o prenúncio da proposta feita por Jesus no Evangelho sobre a fraternidade e o cuidado.
O Salmo 94 da liturgia de hoje, é um chamado, convocando toda a assembleia que se reúne para celebrar o Dia do Senhor. Com alegria, adoração e coração aberto acolhendo o Pastor que vai à frente do povo. O refrão do Salmo faz ressoar em uma só voz a fé no Senhor dos senhores. “Não fecheis o coração; ouvi hoje a voz de Deus”!
Na segunda leitura da carta aos Romanos (Rm 13, 8-10), fala que a única dívida que temos é a do amor mútuo. Novamente aparece a fraternidade o cuidado. Ponto de partida e referência, o coração de todo o Evangelho, que é Jesus. O amor está acima da lei. O cuidado em primeiro lugar. Levantar quem está no chão da fome, da rua, da exclusão, é missão nossa. “Não fiqueis devendo nada a ninguém”. Bela descrição desse amor encontramos na passagem de São Bernardo intitulada: Amo porque amo, amo para amar
O amor basta-se a si mesmo, em si e por sua causa encontra satisfação.
É seu mérito, seu próprio prêmio. Além de si mesmo, o amor não exige motivo nem fruto. Seu fruto é o próprio ato de amar. Amo porque amo, Amo para amar. Grande coisa é o amor, contanto que vá a seu princípio, volte à sua origem, mergulhe em sua fonte, sempre beba donde corre.Sem cessar. O grupo. (Ofício das Leituras, 20 de agosto).
Mateus (18, 15-29) apresenta o discurso de Jesus dirigido aos seus seguidores falando sobre as relações entre aqueles e aquelas que faziam parte da comunidade. Chama atenção da comunidade sobre como se deve proceder quando um membro está criando desconforto ao grupo. Há uma forte exortação em relação à prática da exclusão de quem quer que seja. A orientação é a busca do diálogo. “Se teu irmão pecar contra ti, vai corrigi-lo, mas em particular, a sós contigo”. O bom irmão a boa irmã, vai em busca de quem errou, como faz o Bom Pastor, e conduz quem se afastou da comunidade por ter cometido alguma falha. Há muito que aprender sobre o texto do Evangelho de hoje. É bom lembrar que não se trata de ter atitude de domínio sobre uma pessoa e sim amor que sustenta a ação de quem chama atenção de alguém. Jesus está dirigindo a uma comunidade cristã que tem dificuldade em colocar em primeiro lugar o amor e o cuidado. Este discurso é uma resposta aos discípulos, quando perguntaram para Jesus: ”Quem é o maior no Reino dos céus”. Isso significa que os discípulos não tinham entendido a proposta de Jesus ao falar sobre o Reino de Deus. Parece mesmo que eles não estavam convencidos de que o Reino dos céus é diferente. Por um lado, eles alimentavam um espírito de grandeza e poder. As bem-aventuranças e o mistério da cruz ainda não tinham sido assumidos pela comunidade, em sua totalidade.
Os textos bíblicos deste domingo trazem um alerta em relação á pratica do amor, do perdão e da reconciliação. A comunidade não precisa ser perfeita, o importante é ser espaço facilitador de fraternidade, já que os membros são todos irmãos e irmãs. O cuidado com o irmão e a irmã é um forte apelo para a vida da comunidade que se fundamenta no modo de ser de Jesus. Como um corpo, a comunidade deve cuidar de seus membros “como se fosse um”, este é o pensamento de Jesus. A comunidade deve ter relações fraternas de amor e de reconciliação. Por isso ela precisa refletir e viver as bem-aventuranças, a concórdia interna, respeitando as diferenças. Só assim pode ser presença viva do Ressuscitado. “Vejam como se amam”.
Irmã Maria Teixeira Filho – RA