“Pegue a sua cruz e me siga!”
A liturgia de hoje é um chacoalhão na nossa consciência cristã, trata da necessidade que temos de Deus e de como devemos nos comportar para atender a esse chamado. A primeira leitura nos mostra Jeremias, o profeta que foi ridicularizado por pregar a Palavra. Já o salmo demonstra que nossa alma tem sede de Deus. E na segunda leitura, Paulo esclarece que o sacrifício que Deus quer de nós é que não nos conformemos com as coisas do mundo. Enquanto no Evangelho, Jesus começa a explicar sua paixão para os discípulos e Pedro tem uma reação surpreendente.
A primeira leitura (Jr 20, 7-9) nos mostra o profeta Jeremias, um homem que se dedicou a professar a palavra de Deus, e por isso foi humilhado e rejeitado a vida inteira. De vez em quando, Jeremias se deixava abater pela tristeza e professava palavras duras de rebeldia contra Deus, como no trecho que nos é proposto para a reflexão de hoje. O profeta descreve Deus como um sedutor, que o dominou e subjugou, admite que se deixou seduzir e toma a decisão de romper com esse relacionamento e não mais espalhar a Palavra, mas ele não consegue, porque o fogo de Deus devorou seu coração de tal forma que o profeta não é mais capaz de afastar-se de Deus.
O salmo (Sl 62) reforça a ideia de que, assim como Jeremias, que acolheu a palavra de Deus em seu coração e a espalhava aos quatro cantos, todos nós temos necessidade de Deus, da mesma forma que a terra ressequida tem sede de água.
Na segunda leitura (Rm 12, 1-2), Paulo nos dá uma lição prática sobre o que devemos fazer para agradar a Deus: viver nossa vida centrada no amor e na doação aos irmãos. Deus nos pede uma mudança de coração, de mentalidade e de inteligência. Para isso, nós precisamos transformar o mundo, não podemos nos conformar com ele, isto é, não podemos tomar a forma do mundo onde vivemos. Era exatamente o que o profeta Jeremias fazia, ele tentava transformar o mundo.
O Evangelho de Mateus (Mt 16, 21-27) é ainda mais claro em relação a essa mudança de mentalidade. Jesus começa a contar para os apóstolos que precisa ir para Jerusalém e tudo o que vai Lhe acontecer lá: o escárnio, a tortura, a morte e a ressurreição. A reação de Pedro é a de proteger o Mestre amado. Pedro lança uma oração a Deus, pedindo-Lhe que não permita que tal coisa aconteça a seu Mestre, mas é surpreendido com uma reação imediata de Jesus. A resposta, à primeira vista pode parecer grosseira: “Vai pra longe, satanás! Tu és para mim uma pedra de tropeço…” O mesmo Pedro que, na semana passada, foi chamado de pedra fundamental, sobre a qual Cristo construiria sua Igreja, agora é chamado de pedra de tropeço. Calma! Vamos entender.
No Evangelho do último domingo, Pedro reconheceu a divindade de Jesus por inspiração do Espírito Santo. No de hoje, Pedro se deixa influenciar pela vontade humana de querer proteger aqueles que amamos de qualquer sofrimento. Não está errado aos olhos do mundo, mas não nos deixa ver a vontade do Pai. É isso que Jesus chama de pensamento demoníaco – “Vai pra longe, satanás!” – Ele não está dizendo que Pedro é satanás, mas que seu pensamento está influenciado por ele. Se até Pedro, pedra fundamental da Igreja, pôde ter seu pensamento influenciado pelas coisas do mundo, claro que isso acontece conosco também.
Pensando, ainda, na reação de Jesus. Vemos que Jesus não acolheu os sentimentos de Pedro, não o chamou para conversar e contar por que estava se sentindo assim, ou o que o afligia. Não! Jesus cortou o mal logo pela raiz, porque se dermos muita brecha para o mal nos falar, podemos amolecer nosso coração. Jesus nos alerta para não deixar amolecer o coração; Ele sabia quão dolorido e difícil é fazer a vontade do Pai. Vejam, Jesus, o Deus vivo, no diz que o nosso coração pode ser fragilizado pela conversa de satanás, e que nós, seres humanos, podemos cair na lábia do diabo e nos contaminar com as ideias do mundo.
Como é que atualizamos tudo isso para nossa vida? É simples, estamos fazendo algo para transformar o mundo, como Jeremias, ou estamos nos deixando moldar por ele, como Pedro fez na passagem do Evangelho de hoje? Quando nos acostumamos com as notícias de violência ou escolhemos o churrasco à missa do domingo, estamos nos deixando moldar pelo mundo. Quando achamos que o matrimônio é antiquado e desnecessário para constituir uma família, estamos nos deixando moldar pelos pensamentos do mundo. Quando achamos aceitável o aborto em algumas situações, nós estamos nos deixando moldar pelo mal que vem do mundo.
Mas como podemos imitar Jeremias? Podemos defender a vida nas conversas com os amigos, podemos usar nossas redes sociais para espalhar a Verdade, podemos cobrar nossos representantes no poder legislativo para que tenham posições cristãs, podemos não nos omitir das discussões por medo de sermos ridicularizados. Jesus nunca prometeu um caminho tranquilo, nem de glórias humanas, Ele mandou que cada um pegasse a sua cruz e O seguisse. Está na hora de aceitarmos nossas cruzes, pararmos de nos esquivar e de fato defendermos o Cristo em todas as situações da nossa vida.
Ana Carolina Paiva Angelo
São Paulo – Brasil