Mais uma vez nos preparamos para a Páscoa através da quaresma, um tempo no qual podemos e devemos renovar nossa Aliança com Deus traçando caminhos novos de esperança e de vida.
Viveremos também intensamente a Campanha da Fraternidade na Igreja do Brasil, que é ecumênica como acontece a cada cinco anos. A CF 2021 traz como tema: “Fraternidade e diálogo: compromisso de amor”, e o lema: “Cristo é a nossa paz: do que era dividido fez uma unidade” (Ef 2, 14ª). Visa sobretudo trilhar caminhos de superação, as polarizações e violências tão presentes no cotidiano de nossas vidas, sendo um apelo à unidade em meio à diversidade.
Nas leituras para este primeiro domingo da quaresma algumas palavras chamam nossa atenção: Aliança, Batismo e Conversão. Somente no texto de Gênesis (Gn 9,8-15), a palavra Aliança aparece cinco vezes. Temos aí o relato do recomeço da humanidade, após o dilúvio na história humana. Talvez este dilúvio citado, não tenha sido de maneira nenhuma um dilúvio universal, e os estudos dizem que pode ter sido inspirado nas inúmeras inundações dos rios Tigre e Eufrates e que, de acordo com a arqueologia, podem ter ocorrido entre os anos 4000 e 2800 a.C. Com o passar do tempo, a “fantasia popular” deu a entender que as inundações tenham sido um castigo de Deus. Quem escreveu esta passagem estava ciente destas lendas e mitos, colocando-os assim, como pano de fundo, dando a possibilidade de fazer uma catequese e transmitir uma boa mensagem para nossa vida.
A simbologia do arco-íris é fantástica, pois é algo colorido, onde as cores podem representar as diversas raças e nações, pessoas, diversidade que juntas podem construir algo novo e duradouro que gera vida.
Sabendo que Deus não castiga justos e injustos, o autor propõe esta história de Noé, pessoa correta para Deus que se “salva” deste “castigo”. Este texto situa-se após o episódio do dilúvio, onde Deus em sua misericórdia infinita se dispõe a não mais castigar e faz uma Aliança para sempre com a humanidade, na pessoa de Noé e sua família. Percebemos aí a imensa bondade de Deus, sua misericórdia, selada pela Aliança com todas as gerações.
A carta de São Pedro (1Pd 3,18-22) é direcionada para cinco comunidades de cristãos que vivem fora de sua pátria: Bitínia, Ponto, Galáxia, Capadócia e Asia (1,1). Mesmo mencionando o Apóstolo Pedro, os estudos constatam que não foi ele o seu autor, talvez seja um cristão anônimo. Esta carta pode ter sido escrita no final do século I. Seus destinatários moram em uma realidade rural, com uma economia deficitária em um ambiente difícil e até mesmo hostil para quem quer viver o cristianismo. Diante das provações sofridas o autor convida-os a permanecer firmes na sua fé tendo os olhos fixos em Jesus, que sofreu para ressuscitar após um caminho de cruz. Fortalece-nos na esperança, no amor, a solidariedade, coerência, alegria e fidelidade. Assim como Deus convoca o povo após o dilúvio, cuja água pode ser simbolizada pelo nosso batismo e faz uma Aliança, os cristãos são convocados a vive-la a exemplo e testemunho do próprio Cristo.
O evangelho de Marcos, escrito entre os anos 65 a 70 a.C., responde uma pergunta: Quem é Jesus? É um evangelho bem dinâmico, pois Jesus está sempre em movimento, em intensa atividade. Já no início, logo no primeiro versículo, Marcos já enumera dois títulos de Jesus: Cristo e Filho de Deus. É um texto (Mc 1,12-15) bastante conhecido, no qual fala que Jesus foi tentado no deserto por quarenta dias, fazendo uma curta e resumida narrativa em apenas 2 versículos. Este episódio da tentação é descrito de maneira simbólica e muito rápida.
E este Jesus que é tentado no deserto, onde vive o conflito que vai perpassar toda a sua vida, confirma a Aliança firmada na primeira leitura não se deixando levar pelas tentações.
O deserto que é o lugar do sofrimento, da dificuldade, das lutas internas, das tentações e provações, também se apresenta como o lugar do encontro com Deus, da oração, do confronto consigo mesmo. É onde Jesus busca o fortalecimento do espírito através da oração, do silêncio, do encontro com o Pai. É onde sai vencedor pois não rompe a Aliança com Deus e com o seu povo, mas a confirma no anúncio do Reino de Deus. Vencendo as tentações, isto é, confirmando a nova Aliança Ele convida a todos a construírem também o Reino de Deus que está perto e isto só pode se tornar realidade através da conversão (“Metanoia”) e da boa acolhida do Evangelho.
Para Santa Maria Eugenia, o Reino é a realização do projeto de Deus, em nós, no mundo e tem uma dimensão social. No Reino de Deus somos filhos Dele e irmãos uns dos outros. O grande desejo de Santa Maria Eugênia era exatamente este: Trabalhar pela extensão do Reino de Deus e dizia sempre “devemos pedir a Deus que venha o seu Reino”. Acredita que “os meios para a chegada do Reino são a busca dos direitos de Deus e dos direitos humanos, cidadania e organização do povo e solidariedade, a luta em defesa da vida.”
Por muitas vezes somos tentados de diversas maneiras e especialmente neste tempo desta pandemia infinita, que se prolonga, umas das tentações pode ser a de nos fecharmos cada vez mais em cuidados e isolamentos, onde “eu” sou sempre o centro da atenção e do cuidado. Onde está e como está o outro, meu irmão, minha irmã?
Que neste tempo abençoado de preparação para a Páscoa possamos concretizar a Aliança com Deus e com os irmãos e irmãs, talvez não necessitando ir tão longe, mas bastando vive-la em nossa “pequena esfera”, ao nosso redor, podendo ser: dentro de casa, entre os membros da família, na vizinhança, muitas vezes desconhecida, fazendo destes e outros pequenos espaços nossa Galileia, lugar da missão, da vivência concreta da Aliança renovada e visibilizada. Com gestos tão simples veremos os sinais do Reino de Deus (Aliança) acontecendo e renovando nossa esperança na vida que sempre renasce dentro e fora de nós.
Ir. Maristela Correia Costa