Você já pensou nesta pergunta? Pense um pouco: quantas escolhas você faz por dia?… O ser humano é um ser de escolhas… Porque pensamos e porque somos capazes de nos decidir, fazemos escolhas – todo tipo de escolhas…
Há escolhas que não exigem muito pensar. Elas são tomadas, por assim dizer, no “piloto automático” … Vou de bicicleta ou vou caminhando? Vou subir a escada ou tomar o elevador? … Estas são também escolhas espontâneas. Mas há as induzidas… Você já reparou como as gôndolas são arrumadas nos supermercados e em algumas lojas? As novidades estão logo na frente. Para chegar aos itens “de todo dia”, você tem que passar pelas novidades e vê-las… E aí, muitas vezes você “morde a isca” e leva uma delas… Esta escolha foi sua? Foi, sim, mas não só sua. Você foi levada, tentada, conduzida a ela…
Há outras escolhas, mais sérias, que exigem reflexão, busca, às vezes consulta a outras pessoas. Isto porque são escolhas que podem ter consequências, às vezes a longo prazo. Uma pessoa que se mudou recentemente para outra cidade, por exemplo, e quer buscar uma escola para seu filho continuar os estudos. Quais vão ser os critérios para esta escolha? A escola que fica mais perto? A que vai me custar menos? Aquela que tem mais fama de ser boa escola, com um bom nível de estudos?…
De fato, há escolhas e escolhas… Algumas, como vimos, são tomadas quase que automaticamente, outras exigem reflexão, pesquisa. Mas sempre são algo que depende do exercício de nossa inteligência, de nosso raciocínio, e também de nossa vontade e capacidade de decisão.
Estamos todos e todas agora num momento em que precisamos tomar uma decisão, fazer uma escolha que terá consequências não somente para mim ou para minha família, mas para todo o país. Estamos caminhando em um momento de eleição nacional. O momento é sério, porque está em jogo muita coisa… Que tipo de país queremos que seja o nosso?… Quais são os maiores problemas que nosso país está enfrentando agora e que precisam ser resolvidos por quem tem a missão de governar?… São questões sérias, cujas respostas não podem ser improvisadas se somos pessoas que têm responsabilidade cívica. Sim, porque somos responsáveis pelas escolhas que fizermos nas próximas eleições. E “ser responsável” significa ser capaz de responder por seus atos.
A fim de podermos responder por esta nossa escolha, ou seja, para assumir a responsabilidade de escolher pessoas para conduzir o rumo de nosso país, precisamos de algo que se chama “discernimento”. O que quer dizer esta palavra? Segundo o dicionário, discernimento é “conhecer distintamente; saber distinguir; conhecer com precisão; julgar com sensatez, critério, perspicácia”. Tudo isto nos mostra que, para fazer a escolha cívica de quem vai governar nosso país pelos próximos quatro anos, precisamos ter os pés no chão e não nos deixarmos enganar facilmente. Precisamos ser espertos, espertas, para poder distinguir o verdadeiro do falso, pois, em época de campanha – como estamos agora – há candidatos que não hesitam em lançar mentiras e boatos para alavancar suas próprias candidaturas… “Discernimento”, portanto, é a capacidade de refletir em profundidade em vista de tomar uma decisão. E é isto o que estamos precisando fazer agora.
Admiradores e admiradoras que somos de Santa Maria Eugênia, podemos nos inspirar nela para este nosso discernimento. Ela foi uma pessoa profundamente comprometida com o seu tempo. Desde sua infância, ela se habituou a ouvir os adultos conversando sobre a situação do país e sobre possíveis opções políticas. Seu pai tinha sido um político – deputado pela região da França chamada Moselle – e muitas pessoas que frequentavam sua casa viviam neste ambiente de responsabilidade política. Já adulta, ela se mostrou ser uma mulher de fé. Não nos surpreende, portanto, que suas opções políticas tenham se baseado numa reflexão sobre a realidade vivida na sociedade de seu tempo assim como sobre seu profundo sentido de fé.
Sim, Maria Eugênia tinha suas opções políticas… Ela sabia analisar a realidade e percebia que a sociedade de seu tempo – assim como a nossa hoje – era muito desigual e injusta, com pessoas muito ricas e um grande número de pessoas muito pobres, lutando para poder viver. E sua fé lhe dizia que Deus não quer que seja assim… Por isso, ela desejava trabalhar para uma transformação social. Ela tinha um sonho para o seu país. Ela dizia: “Sonho com um estado social em que nenhum ser humano tenha que sofrer opressão de outro ser humano” (cf. carta ao P. Lacordaire, em “As Origens da Assunção”, tomo 1). E você, qual é o sonho que você tem para o nosso país? Pense um pouco…
Maria Eugênia não era ingênua: ela sabia que uma transformação social não se faz do dia para a noite… Esta transformação é um processo que precisa de tempo para acontecer. Ela se dá por meio de passos, de etapas… O tempo em que Maria Eugênia viveu foi um tempo de grande turbulência política. Ela sabia muito bem que não havia um líder perfeito para conduzir o país, nem tampouco um partido perfeito. Todos são humanos, como nós, capazes de coisas boas e de coisas erradas…
“As alterações políticas, os sucessivos governos, vão conduzir Maria Eugênia cada vez mais a esta mesma convicção; as decepções que trazem a cada etapa, longe de fazê-la desanimar, agora fortificam sua fé. Mais do que nunca, defende os direitos do homem por sua dimensão transcendental. Nunca perde a esperança no ser humano e na humanidade, mas sua esperança está totalmente em Deus” (“Por Jesus e pelo Reino”, 1ª edição, pg.99).
Temos que ter esta mesma clareza que teve Maria Eugênia. Em nosso discernimento, não procuremos pelo candidato “perfeito”, porque ele não existe… Procuremos, isto sim, por aquele que pode conduzir o país a dar alguns passos no sentido de realizar o sonho que temos para nossa terra.
Lendo o jornal há algumas semanas atrás, fiquei impressionada e feliz ao descobrir a citação de um trecho do grande educador brasileiro Paulo Freire, que retoma a mesma ideia expressa por Maria Eugênia: “(….) uma sociedade em que nenhum homem, nenhuma mulher, nenhum grupo de pessoas, nenhuma classe explore a força de trabalho de outros. É uma sociedade em que não há privilégios para os que trabalham com a caneta e só obrigações para os que trabalham com as mãos na roça ou nas fábricas. Todos são trabalhadores a serviço do bem de todos” (Paulo Freire, citado em uma Carta ao Redator, no “Correio Braziliense” de 15/08/2022. Lamentavelmente, o autor da carta não citou o nome da obra de Paulo Freire da qual extraiu o texto acima).
Das ideias acima expostas, duas podem ajudar muito em nosso discernimento: o desejo de libertação da opressão, isto é, da desigualdade social, e o trabalho para o bem de todos. Refletindo sobre as propostas apresentadas por cada candidato, procuremos ver quem mais se aproxima da construção de uma sociedade mais igualitária por meio de ações que visem o bem comum, isto é, o bem da sociedade como um todo.
Existe um caderno publicado pelo CNLB (Conselho Nacional do Laicato do Brasil), apoiado pela CNBB, que ajuda também muito nesta nossa busca por uma escolha que seja consciente e bem fundada. Através de vários textos do Papa Francisco, ele aponta critérios importantes a serem levados em conta. O caderno se chama “Encantar a Política” e pode ser baixado na internet. Procurem lê-lo.
Que todos e todas possamos fazer uma boa escolha. Que seu voto seja consciente!
Ir. Regina Maria Cavalcanti